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YUDISTHIRA ÀS
PORTAS DO CÉU
O bom Rei Yudisthira governava
o povo de Pandava havia muitos anos e os conduzira a uma guerra
vitoriosa, porém muito longa, contra gigantescas forças
do mal. Concluídos seus esforços, Yudisthira percebeu
que já passara muitos anos na terra e que era hora de
partir para o reino dos Imortais. Depois de terminado todo o
planejamento, dirigiu-se até a grande Montanha a fim de
alcançar a Cidade Celestial. Sua linda esposa, Drapaudi,
foi com ele, e também o acompanharam seus quatro irmãos.
Logo no início do caminho, juntou-se a eles um cão,
que os seguia em silêncio.
Mas a jornada até a montanha era longa e penosa. Os quatro
irmãos de Yudisthira foram morrendo pelo caminho, um a
um, e depois deles, a linda esposa Drapaudi. O rei ficou totalmente
só, exceto pelo cão, que o acompanhou fielmente
por toda a árdua e demorada subida em direção
à Cidade Celestial.
Finalmente os dois exaustos e enfraquecidos, chegaram diante
das portas do Firmamento. Yudisthira curvou-se em humilde reverência
ao pedir que fosse aceito.
O céu e a terra se encheram de estrondoso ruído
quando o Deus Indra, o Deus de Mil Olhos, chegou para receber
o Rei no Paraíso. Mas Yudisthira ainda não estava
pronto.
- Sem meus irmãos e minha querida esposa, minha inocente
Drapaudi, não desejo entrar no Céu, ó Senhor
de todas as divindades.
- Não tema - respondeu Indra. - Você os encontrará
a todos no Céu.
Eles chegaram antes e estão aqui !
Mas Yudisthira ainda tinha um pedido a fazer.
- Este cão acompanhou-me por todo o caminho até
aqui. É devotado a mim. Por sua fidelidade, não
posso entrar sem ele ! E além disso, meu coração
lhe tem muito amor.
Indra balançou a enorme cabeça e a terra toda tremeu.
Só você pode ter a imortalidade - disse ele - e
a riqueza, e o sucesso, e todo o júbilo do Céu.
Você conquistou isso empreendendo a árdua jornada.
Mas não pode trazer um cão para dentro do Céu.
Livre-se do cão, Yudisthira.
Não é nenhum pecado !
- Mas para onde irá ele ? E quem irá acompanhá-lo
? Ele desistiu de todos os prazeres da terra para ser meu companheiro.
Não posso abandoná-lo agora.
O Deus se irritou com aquilo e disse com firmeza:
- Você precisa estar puro para entrar no Paraíso.
Um simples toque num cão eliminará todos os méritos
da oração. Reconsidere o que está querendo
fazer, Yudisthira. Deixe que o cão se vá.
Mas Yudisthira insistiu:
Ó Deus de Mil Olhos, é difícil para uma
pessoa que sempre tentou ser justa, fazer algo que considere
injusto, mesmo que seja para entrar no Firmamento. Não
desejo a imortalidade se para tanto é preciso livrar-me
de alguém que me é devotado.
Indra o instigou mais uma vez:
- Você deixou para trás, na estrada, quatro irmãos
e a mulher. Por que não pode deixar também o cão
?
Mas Yudisthira respondeu:
- Abandonei-os apenas porque já tinham morrido e eu não
poderia mais ajudá-los nem trazê-los de volta à
vida. Enquanto estavam vivos eu, não os abandonei.
- Você está disposto a abandonar o Céu, então,
por causa desse cão ? - perguntou-lhe o Deus.
- Grande Deus de todos os Deuses - retrucou Yudisthira - sempre
mantive minha promessa, nunca abandonei quem tivesse medo e viesse
à minha procura, quem estivesse aflito e desvalido ou
quem estivesse fraco de mais para se proteger sozinho e desejasse
ainda viver. Acrescento agora um quarto elemento. Prometo não
abandonar quem for devotado a mim. E não vou abandonar
meu amigo.
Yudisthira abaixou-se para acariciar o cão e estava prestes
a afastar-se tristemente do Céu quando, de repente bem
diante de seus olhos aconteceu um prodígio. O cão
fiel transformou-se em Dharma, o Deus da Virtude e da Justiça.
Indra disse:
Você é um bom homem, Rei Yudisthira. Demonstrou
fidelidade aos fiéis e compaixão por todas as criaturas.
Mostrou-se capaz disso ao renunciar aos próprios Deuses
em vez de renunciar a esse humilde cão que era seu companheiro.
Será honrado no Céu, ó Rei Yudisthira, pois
não existe um ato que seja mais elevado e mais ricamente
recompensado, do que a compaixão para com os humildes.
Então, Yudisthira entrou na Cidade Celestial tendo ao
lado o Deus da Virtude. E lá tornou a encontrar-se com
os irmãos e a querida esposa para desfrutarem da eterna
felicidade.
(Extraído do Mahabharata)
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